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Pacientes com necessidades especiais são quase invisíveis na odontologia

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Por Vera Garcia*

Reconhecida pelo Conselho Federal de Odontologia, somente em 2002 a Odontologia para pacientes com necessidades especiais (quando digo necessidades especiais me refiro a pessoas com má formação, deficiências motoras, paralisias, síndromes e autismo) ainda é uma especialidade extremamente difícil de ser encontrada no Brasil. Já se passaram 16 anos e são aproximadamente 560 profissionais, no Brasil, capacitados para oferecer tratamento odontológico a esse público.  Levando em conta que quase 24% da população brasileira, ou seja, 45 milhões de pessoas possuem algum tipo de deficiência, segundo o último Censo do IBGE, é uma situação totalmente deplorável! É uma gama enorme de pacientes reservada para essa especialidade, mas, infelizmente, só há em torno de 560 especialistas inscritos no Conselho Federal de Odontologia. No Estado de São Paulo de acordo com o Conselho Regional, apenas 181 dentistas atuam nessa área!

Pacientes com essas necessidades possuem maior dificuldade de higiene bucal por conta das limitações. Eles têm uma necessidade aumentada para o cuidado preventivo odontológico. No caso de pessoas com deficiência intelectual, que têm limitações significativas tanto nas funções intelectuais quanto na adaptação ao ambiente (o que prejudica atividades cotidianas sociais e práticas), tal condição influencia diretamente a saúde bucal, já que essas pessoas com transtornos intelectuais dependem quase que totalmente do apoio de familiares ou de alguém responsável para a realização dos procedimentos básicos de limpeza da boca.

De acordo com o presidente da Câmara Técnica do CROSP (Conselho Regional de Odontologia de São Paulo) o maior desafio é contar com profissionais capacitados para o atendimento. “A demanda é maior que o número de especialistas. Para se ter uma ideia, 1% da população brasileira, cerca de 2 milhões de pessoas, é autista. Já o número de profissionais para atendê-los é de 535. É um problema de saúde pública”.

Certamente é um problema de saúde pública, pois o governo deveria investir nesse segmento tão humilhado e maltratado.

É fundamental a inclusão da especialidade no currículo acadêmico do curso de odontologia, para que esses futuros profissionais aprendam a lidar com as limitações físicas e intelectuais dos pacientes, e consequentemente tenham menos preconceito. No Brasil, a disciplina de Odontologia para pacientes com necessidades especiais não é obrigatória nas universidades, ou seja, nem todos os cirurgiões-dentistas tiveram em sua formação conhecimento para atender a esse segmento. São raros os dentistas que têm essa preocupação e se sensibilizam com a causa, dois exemplos são as doutoras Adriana Zink  e Patricia Kapicius, do Estado de São Paulo. Raríssimos são os dentistas que dominam técnicas, abordagens diferenciadas e tenham sensibilidade e  compromisso para desenvolver um trabalho com amor.  Todo ser humano, independente de sua capacidade física e intelectual, merece um tratamento digno e de qualidade em saúde bucal.

É preciso, urgentemente, que o Ministério da Saúde dê subsídios as faculdades de Odontologia, incentivando os profissionais já atuantes ou que venham aderir a essa especialização, com treinamentos adequados para atendimentos posteriores. E também há necessidade das prefeituras criarem nas Unidades dos CEOs ( Centros de Especialidades Odontológicas) dos seus municípios essa especialização, e caso já existam deveriam ser ampliadas, uma vez que há muita demanda e urgência da necessidade que requer essas patologias.

O que costumeiramente acontece é que pacientes que não tem nenhum tipo de necessidade especial, ou mesmo tenha uma deficiência que não seja tão grave, procuram um consultório odontológico convencional e conseguem resolver o seus problemas. Por outro lado pessoas com má formação, deficiências motoras, paralisias, síndromes e autismo ficam na dependência de ONGs, onde o tempo de espera é muito longo e infelizmente há poucas unidades.

Para finalizar, a impressão que eu tenho é que esse segmento é quase invisível na odontologia e invisível aos olhos do governo brasileiro. Isso é desumano e inconstitucional, uma vez que a constituição diz que todos somos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.

*Pedagoga e administradora dos blogs Deficiente Ciente e Criança Especial

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Vera Garcia

Paulista, pedagoga e blogueira. Amputada do membro superior direito devido a um acidente na infância.

6 thoughts on “Pacientes com necessidades especiais são quase invisíveis na odontologia

  • Denise Martins Ferreira

    Eu e minha filha (deficiência mental e intelectual) temos duas profissionais que são especialistas e fazem a diferença em nossas vidas: Dra. Fábia Ribeiro e Dra. Virgínia Nunes Passos. Antes da Dra. Fábia que atendeu Mariana por mais de quinze anos eu já “sentei” sobre as pernas de Mariana, a auxiliar segurava as mãos e outra a cabeça. Cenas de horror. Depois conhecemos a Dra. Fábia que Mariana me lembrava que estava no tempo de retornar. Há pouco menos de um ano a Dra. Fábia fez a transição cautelosa e com todo o afeto possível para Dra. Virginia e tudo continuou da mesma forma. Mariana adora a consulta, dá trabalho perguntando tudo, mas o carinho e a competência igual. Como conselheira municipal de saúde faço sempre que é possível menção a necessidade de desenvolver a relação paciente/dentista com as pessoas com deficiência especialmente com deficiência intelectual, transtornos e outras necessidades de atenção diferenciada. Não dá para ir ao dentista uma vez ao ano, deixar que uma ou várias cáries se manifestem e ter que fazer tratamentos invasivos e dolorosos! Especialmente essas pessoas devem ser atendidas com prevenção! O que o SUS prevê! Atenção básica! Precisamos de mais odontólogos que tenham desejo de atender pessoas com deficiência e que possam fazer seu trabalho corretamente. Temos tratamentos com anestesia geral,muitos são atendidos assim. Não é uma violência que possivelmente seria desnecessária se houvesse limpeza periódica, a construção da relação de confiança e afeto entre o cliente e o profissional da saúde? Tod mundo ganha!!!!

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  • Maria Elizabeth

    Tenho uma adolescente com paralisia , aqui no estado do Rio de janeiro precisamente em Niterói não há dentista para esse seguimento.E uma tortura,uma verdadeira peregrinação para conseguir um dentista para Ela.

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    • Marcelo Furia Cesar

      Parabéns pela abordagem do tema. Sou ESPECIALISTA EM ODONTOPEDIATRIA e realizo atendimento a pacientes especiais há mais de 20 anos. Também trabalhei 15 anos como docente em faculdade de odontologia. As colocações da autora quanto a falta de profissionais disponíveis, interessados e capacitados para atenção diferenciada aos pacientes estão corretas, e as observações da Colega Dentista com relação a importância de um trabalho e programa de prevenção sistemática e contínua para esse grupo de pacientes é muito importante.

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  • Lilian Cristina Guedes

    Sou dentista especialista em pacientes especiais em Campinas e notei logo q comecei a especialização que falta programa de prevenção odontológica nas instituições públicas. Outro fator importante é que diante do diagnóstico e o encaminhamento para uma equipe multidisciplinar o dentista não é lembrado! Os dentistas que eu conheço consideram difícil a especialidade e infelizmente encaram que não nasceram com dom.

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  • Adriana Albuquerque

    Excelentes artigos. Parabéns

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  • Maria Eduarda Batista da Silva

    Sou estudante de Odontologia e acho essa disciplina extremamente necessária e empática. Ela aumenta a diversidade e abrangência no território odontológico, dando higiene e qualidade bucal a todas as pessoas, inclusive deficientes .

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