Movimentos que não param: o que está por trás da Síndrome de Tourette?
A síndrome de Tourette é um transtorno neurológico que, apesar de ainda ser pouco compreendido por muitas pessoas, faz parte do dia a dia de milhares de crianças e adolescentes. Ela se caracteriza por tiques motores e vocais involuntários, que costumam surgir na infância e podem persistir por anos. Neste artigo, vamos explicar de forma clara e acessível o que é a síndrome de Tourette, quais são seus sintomas, como ela é diagnosticada, os tratamentos possíveis e como as famílias e as escolas podem apoiar as crianças que convivem com esse quadro.
O que é a Síndrome de Tourette?
A síndrome de Tourette é um distúrbio neuropsiquiátrico. Isso quer dizer que ela está relacionada ao funcionamento do cérebro e afeta tanto o comportamento quanto o corpo. Sua principal característica são os tiques, que são movimentos ou sons involuntários, rápidos e repetitivos.
Esses tiques podem ser motores (como piscar os olhos ou balançar a cabeça) ou vocais (como emitir sons, tossir ou repetir palavras). A síndrome de Tourette geralmente começa na infância, entre os 5 e os 10 anos de idade, e tende a se manifestar mais nos meninos do que nas meninas.
Por que os tiques acontecem?
A ciência ainda não descobriu com exatidão o que causa a síndrome de Tourette. No entanto, acredita-se que haja uma forte influência genética. Muitos pacientes têm histórico familiar de tiques, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) ou transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
Além disso, fatores ambientais e neurológicos também podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento da síndrome. Ou seja, não é culpa de ninguém – nem da criança, nem dos pais.
Como os tiques se manifestam?
Os tiques podem variar muito de uma criança para outra. Algumas têm tiques leves e quase imperceptíveis, enquanto outras apresentam tiques mais intensos e frequentes. Eles também podem mudar ao longo do tempo – tanto em tipo quanto em intensidade.
Exemplos de tiques motores:
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Piscar os olhos repetidamente
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Fazer caretas ou franzir a testa
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Balançar a cabeça de forma involuntária
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Movimentar braços ou pernas de forma rápida e inesperada
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Tocar em objetos ou pessoas sem intenção
Exemplos de tiques vocais:
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Tossir, fungar ou limpar a garganta com frequência
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Produzir grunhidos ou sons estranhos
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Dizer palavras fora de contexto
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Repetir frases que ouviu (ecolalia)
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Falar palavrões ou ofensas sem querer (coprolalia – ocorre em menos da metade dos casos)
É importante reforçar que a criança não faz isso por mal. Os tiques são involuntários, e repreender a criança só aumenta o estresse — o que, por sua vez, pode piorar os sintomas.
A Tourette é só isso?
Muitas crianças com Tourette também têm outras condições associadas. As mais comuns são:
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TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade)
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TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo)
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Ansiedade ou dificuldades emocionais
Essas condições, quando presentes, precisam ser observadas e tratadas com atenção, pois podem afetar o rendimento escolar, a autoestima e a convivência social da criança.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico da síndrome de Tourette é clínico, ou seja, é feito com base na observação dos sintomas e na conversa com a família. Os critérios mais usados incluem:
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A presença de tiques motores múltiplos e pelo menos um tique vocal, que podem ou não ocorrer ao mesmo tempo.
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Os tiques ocorrem várias vezes ao dia, quase todos os dias, por pelo menos 1 ano.
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Os primeiros sintomas aparecem antes dos 18 anos de idade.
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Os sintomas não são causados por outra condição médica ou uso de substâncias.
Não há um exame de sangue ou de imagem que confirme o diagnóstico. Por isso, é essencial consultar um neurologista infantil ou psiquiatra especializado.
Existe tratamento?
Sim! Embora a síndrome de Tourette não tenha cura, ela pode ser controlada. O tratamento varia de acordo com a gravidade dos tiques e o impacto na vida da criança. Nem todos os casos precisam de medicação. Muitas vezes, só o acompanhamento psicológico e o apoio familiar já são suficientes.
1. Terapia comportamental
Uma das abordagens mais eficazes é a Terapia de Reversão de Hábito. Nela, a criança aprende a reconhecer o momento antes de um tique e a responder com outro comportamento que bloqueie o tique. Com o tempo, essa técnica pode ajudar a reduzir a frequência dos tiques.
2. Medicamentos
Nos casos mais graves, o médico pode indicar o uso de medicamentos antipsicóticos, que ajudam a diminuir os tiques. Há também o uso de toxina botulínica (botox) em tiques localizados.
3. Estimulação cerebral profunda
É uma técnica ainda pouco comum e usada em casos extremos, quando outros tratamentos não funcionam. Consiste em implantar eletrodos no cérebro para reduzir os tiques. Esse procedimento é mais indicado em adultos.
E na escola? Como lidar?
A escola tem um papel fundamental na inclusão da criança com Tourette. Professores e colegas devem entender que os tiques não são comportamentos desrespeitosos ou provocativos. Por isso:
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Evite chamar a atenção em público
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Promova rodas de conversa sobre diversidade
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Estabeleça um ambiente acolhedor e sem julgamentos
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Respeite o ritmo da criança, especialmente em momentos de crise
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Trabalhe em parceria com a família e com a equipe multidisciplinar
Um ambiente que acolhe e compreende é essencial para o desenvolvimento saudável da criança.
Como os pais podem ajudar?
O acolhimento da família é o primeiro passo. Muitas crianças com Tourette se sentem incompreendidas ou envergonhadas pelos tiques. Pais que acolhem, escutam e explicam com calma o que está acontecendo fazem toda a diferença.
Algumas atitudes práticas que os pais podem adotar:
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Busque apoio psicológico para a criança e para a família
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Estimule hobbies e talentos (música, desenho, esportes, etc.)
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Reduza o estresse e promova uma rotina equilibrada
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Fale com a escola sobre o diagnóstico
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Procure grupos de apoio e informações confiáveis
Tecnologia assistiva ajuda?
Sim, especialmente em ambientes escolares e em casa. Embora a Tourette não exija dispositivos específicos como leitores de tela ou cadeiras adaptadas, alguns recursos podem contribuir com o bem-estar emocional e o foco da criança:
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Fones com cancelamento de ruído (para reduzir estímulos sensoriais)
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Pulseiras sensoriais ou brinquedos de textura (ajudam no autocontrole)
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Softwares educativos interativos, que tornam o aprendizado mais envolvente
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Apps de mindfulness e respiração, para momentos de ansiedade
Esses recursos não curam, mas ajudam a criar um ambiente mais tranquilo e acolhedor — tanto em casa quanto na escola.
Um convite ao acolhimento
Por fim, é essencial lembrar que crianças com síndrome de Tourette não precisam de julgamento — precisam de compreensão, empatia e apoio. A sociedade ainda lida com muitos mitos e preconceitos quando se trata de comportamentos atípicos, mas isso pode mudar com informação e diálogo.
Se você é pai, mãe, educador ou convive com alguém com Tourette, saiba que o conhecimento transforma. Aprender sobre o transtorno, falar abertamente sobre ele e oferecer apoio emocional é o primeiro passo para uma convivência mais leve e respeitosa.
E para se inspirar ainda mais, vale assistir ao filme “O Primeiro da Classe” (2008), que conta a história real de Brad Cohen, um jovem com síndrome de Tourette que enfrentou o preconceito, superou as dificuldades na escola e realizou seu sonho de se tornar professor. A história mostra de forma tocante como acolhimento, informação e persistência podem mudar destinos.
Gostou do artigo? Tem alguma dúvida ou quer compartilhar sua experiência? Comente abaixo! Seu depoimento pode ajudar outras famílias a se sentirem mais compreendidas e acolhidas.
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