Mercado de Trabalho

Os problemas da “cota de deficientes”

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O texto abaixo foi extraído do site Última Estância e foi escrito pelo advogado Rafael Rios Monteiro. Veja, abaixo,  os questionamentos indagados por ele a respeito da referida lei.

Sem mais pormenores, a Lei 8.213/91, acerca da obrigatoriedade de as empresas contratarem pessoas portadoras de deficiência, da seguinte maneira assevera:

Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:
I – até 200 empregados……………..2%;

II – de 201 a 500…………………….3%;

III – de 501 a 1.000………………….4%;

IV – de 1.001 em diante……………..5%.

§1º. A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante.

§2º. O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados.

A lei é clara e taxativa, sendo o critério de inclusão exclusivamente numérico. Se a empresa tem mais de cem empregados, deve ela contratar pessoas portadoras de deficiência na proporção supra mencionada. Contudo, a par do “nobre” intuito legal, a realidade laboral pátria impõe uma série de questionamentos a respeito da referida lei.

O primeiro é o seguinte: por que, mesmo depois de quase vinte anos, muitas pessoas desconhecem tal obrigação? Verdade que apenas “grandes” empresas (já que há necessidade de se ter mais de 100 empregados) possuem a obrigação legal em tela. Porém, não se pode negar que a sociedade, via de regra, desconhece-a.

Em segundo lugar, é patente o intuito do Estado de eximir-se de solucionar a problemática da inclusão das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho, transferindo esse ônus para a iniciativa privada.

Pauta-se na função social da atividade empresarial. Ou seja, a empresa, que teria a obrigatória participação na construção de uma sociedade (capitalista) mais justa, tem de ajudar pessoas integrantes de minorias socialmente excluídas, como os portadores de deficiência, oferecendo-lhes oportunidade de emprego.

Isso, importa não negar, sempre existiu, já que o Estado, costumeiramente se vendo incapaz de solucionar os problemas sociais, repassa suas obrigações à sociedade.

Ocorre que a questão não é tão simples, mormente quando se fala no assunto em apreço. Em verdade, parece que se olvida que a oferta de vagas, por si só, não soluciona o problema. Há necessidade de se oferecer também efetiva qualificação profissional, para que a inclusão social pretendida seja eficaz.

Muitas empresas hoje, a propósito, encontram grande dificuldade para preencherem as vagas que são por lei obrigadas a oferecer. Normalmente, não há deficientes com qualificação, ainda que em grandes centros, como as principais regiões metropolitanas do país.

Aliás, muitos deficientes sequer procuram melhor formação para o trabalho.

Assim, ainda que as empresas tenham responsabilidade na solução do problema em tela, esta não lhes cabe de forma exclusiva. Se o Estado e o restante da sociedade não somarem esforços, de nada adiantará a imposição da lei.

Volvendo-se à redação legal, mister apontar mais um questionamento: a injustiça gerada pelo estabelecimento de simples critério numérico para a contração de deficientes.

É que não se levou em conta a atividade econômica desenvolvida pela empresa, circunstância esta de fundamental importância eficácia da medida aqui abordada.

Explica-se: dependendo da atividade desenvolvida pela empresa, a contratação de portadores de deficiência pode restar prejudicada ou mesmo inviabilizada, pois há casos em que as empresas podem não conseguir contratar pessoas portadoras de deficiência.

Veja-se, de forma exemplificativa, o caso das empresas que precisam contratar profissionais extremamente qualificados, como as de vigilância e daquelas que contam com grande número de motoristas para transporte de cargas pesadas, inflamáveis ou perigosas.

Tais funções requerem específica formação para seu exercício, como cursos de formação, habilitação específica, etc.

O aresto abaixo transcrito que, apreciando a peculiaridade do caso das empresas de vigilância na observância da cota em tela, decidiu que os empregados contratados como requisitos para cumprimento de determinada obrigação não devem ser considerados na base de cálculo do referido artigo. Veja-se:

AÇÃO ANULATÓRIA – AUTO DE INFRAÇÃO – INVALIDADE – Considerando as peculiaridades da profissão de vigilante, disciplinada na Lei nº 7.102/83, a qual prevê, entre outros requisitos a aprovação em curso de formação de vigilante e em exame de saúde física, mental e psicotécnico, o cálculo do percentual previsto no art. 93, da Lei nº 8.213/91 para as empresas privadas que exploram serviços de vigilância não deve incluir os empregos para os quais se exija o curso de formação de vigilantes (TRT-RO- RO-437- 2007-018-10-00-1- DJ 17.10.2008). Nessa esteira, afigura-se irregular o auto de infração da fiscalização do trabalho que considerou o percentual legal incidente sobre os 1103 empregados registrados da empresa, e não apenas sobre o efetivo, apartados os cargos de vigilantes. (TRT 10ª R. – RO 00724-2008-001-10-00-0 – 1ª T. – Relª Juíza Maria Regina Machado Guimarães – J. 18.02.2009)

Por derradeiro, tem-se a atuação do Ministério Público do Trabalho, mormente através das Delegacias Regionais do Trabalho que, olvidando-se de todas as questões supra mencionadas, simplesmente impõem às empresas a necessidade de contratação, sob pena de aplicação de exorbitantes multas administrativas.

Como dito anteriormente, a não contratação de pessoas portadoras de deficiência não decorre apenas da vontade empresarial. Em muitas vezes, não há profissionais qualificados; em outras, a atividade da empresa não comporta a contratação.

Destarte, não se pode, tão-somente, exigir o respeito ao artigo 93 da Lei 8.213991, sobretudo quando este se pauta em critério meramente objetivo, numérico. Em verdade, deve a lei, ser interpretada com a consideração das peculiaridades materiais de cada caso concreto, pois, caso contrário, far-se-á injustiça com o intuito de se fazer justiça (contratar pessoas portadoras de deficiência e gerar problemas ao empresariado).

Fonte: http://ultimainstancia.u
ol.com.br/

Obs. Terminologia correta para as expressões da matéria acima, segundo Romeu Kazumi Sassaki :
“Portadores de deficiência” “pessoas portadoras de deficiência” “deficientes”
TERMO CORRETO: Pessoa(s) com deficiência

Abre-se uma exceção em títulos de matérias jornalísticas por motivo de economia de espaço.

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Vera Garcia

Paulista, pedagoga e blogueira. Amputada do membro superior direito devido a um acidente na infância.

7 thoughts on “Os problemas da “cota de deficientes”

  • Deficiente Ciente

    Na minha opinião, as empresas precisam em primeiro lugar, ter conhecimento sobre os alcances e limites das pessoas com deficiência. Infelizmente, devido ao preconceito, muitas empresas sequer sabem sobre as potencialidades, habilidades, barreiras e limites ultrapassados pelas pessoas com deficiência.

    Em segundo lugar, é necessário parceria entre governo e empresas privadas, no que diz respeito ao investimento nas PCDs. Rampas, banheiros adaptados, leitores de tela, impressoras de braille, intérpretes de libras, softwares de voz, deveriam, há muito tempo, fazer parte da estrutura de qualquer empresa, seja ela de pequeno, médio ou grande porte.

    E por último, é extremamente necessário investimento, por parte do governo, na formação inicial e continuadas dos professores, no que se refere ao mínimo de conhecimento e prática que os professores deveriam ter a respeito de alunos com deficiência. Caso os profissionais de educação não estejam preparados para trabalhar com esses alunos, provavelmente, os mesmos, serão excluídos do sistema de ensino. E consequentemente aumentará o número de profissionais com deficiência desqualificados.

    Vera (Deficiente Ciente)

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  • Regina

    Vera, tens toda a razão, amiga, toda a razão…

    No Japão, na época em que eu trabalhava lá como "peã", em todos os lugares se via o respeito às pessoas com deficiência e aos idosos… Desde praças até grandes indústrias. Em todas as fábricas por quais passei, haviam pessoas com deficiência trabalhando junto com as demais, normalmente, com todo aparato e infra-estrutura necessários e convivíamos todos harmoniosamente. Aquilo sim, era um exemplo de inclusão social, ao meu ver…

    Posso estar enganada, mas penso que lá, por ser um país com um passado bastante trágico devido às guerras e por ser também um país onde as pessoas têm uma expectativa bastante alta de vida, os governantes, naturalmente, olham mais para este lado e fazem de tudo para facilitar a vida destas pessoas… Se bem que eles facilitam a vida de todas as pessoas, com deficiência, ou sem deficiência! Enfim…

    Adentrei neste assunto, por quê? Porque creio que a chave para tudo, é a educação… e lá, a educação é levada muitíssimo a sério…

    É o que você comentou, enquanto não existirem profissionais qualificados, haverá cada vez menos pessoas com deficiência preparadas para enfrentarem o mercado de trabalho… Assim com também, as pessoas de baixa renda que acabam não tendo acesso à educação de qualidade, como as demais…

    Mas vamos torcer (e também agir) para que esta realidade mude… Juntos, chegaremos lá!!!

    Tenha um ótimo fim de semana, amiga!!

    Beijo!!!

    Resposta
  • Deficiente Ciente

    Regina, concordo plenamente com você! A chave para tudo, com certeza, é a educação!

    Olha o exemplo que você acabou de dar. Realmente, o Japão possui a maior expectativa de vida do mundo e também é o lugar onde se valoriza a educação. No Brasil, a educação deveria ser prioridade!

    Ainda chegaremos lá…A união faz a força!

    Um ótimo final de semana para você também!!

    Beijos!
    Vera

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  • cRiPpLe_rOoStEr a.k.a. Kamikaze

    Nesse país onde a lei mais respeitada é a Lei de Gérson, uma forma mais fácil de incluir deficientes no mercado de trabalho seria isenção de impostos para cobrir despesas da empresa com capacitação de deficientes e o eventual custo de próteses a serem fornecidas para o funcionário trabalhar com mais conforto, segurança e até alguma melhora na autoestima. Num supermercado do interior de Santa Catarina eu já fui atendido por um amputado transradial e notei que ele tinha alguma dificuldade para manusear algumas caixas de papelão e se tivesse ao menos uma prótese passiva poderia ter mais facilidade para apoiar alguns objetos que estivesse manuseando e até a questão da autoestima, já que ao invés de apertar a mão esquerda de clientes poderia usar a direita como é costume no sul do país.

    Resposta
  • Maria Cristina

    Tudo que foi dito é de relevância extrema, mas há uma questão que precisa mudar, que é o olhar da família, pois são muitas as que não acreditam no potencial de seus filhos estagnando-se ao pouco, portanto é necessário muitas ressignificações de conceitos. Incluir vai muito mais além da integração.
    É necessário acessibilidade, mas será arcaica se a família e o mundo não entender que as limitações de um indivíduo não são barreiras para exercer seu potencial. Sou professora de AEE e a maior desafio e mostrar às famílias dos PNEs que eles são capazes.
    Espero ter contribuído, abraços mil.
    Maria Cristina da S.M.Teixeira – Sorocaba – SP

    Resposta
  • Vera (Deficiente Ciente)

    Seu comentário foi muito pertinente, Maria Cristina. Realmente tem a questão da família, onde muitos pais não incentivam, não dão o apoio necessário para que seu filho desenvolva e tenha mais autonomia. O incentivo e o encorajamento da família é fundamental para o crescimento do filho, principalmente quando este tem alguma deficiência.
    Assim como você enriquece e contribui com seu trabalho na escola, enriqueceu e contribuiu muito aqui.

    Abraços e volte sempre!

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  • Vera (Deficiente Ciente)

    Belo exemplo, Daniel! Gosto muito dos seus comentários!

    Resposta

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